O lado B do parto da Carol

Ontem minha filha fez 1 ano! Fiquei relembrando cada momento e resolvi colocá-los na minha timeline no facebook, em tempo real… apenas com 1 ano de delay! rs

Então surgiu a ideia de passar tudo pra cá, pra nunca se perder. Não foi fácil transcrever emoções e sentimentos. Fiquei chorosa o dia todo. Dá até vontade de ter outro e outro filho… 🙂

O relato ‘lado A’, você encontra aqui!

.

.

8 de Abril de 2014.

9:00

Rogério veio me acordar, como de costume. Ao tentar me levantar, um líquido escorreu no lençol. Xixi? Líquido amniótico? É a bolsa mesmo! (dancinha da vitória). Você espera, mas nunca está realmente preparada. (é a bolsa? meu Deus! Vai nascer! Vai ser hoje será?)

Vou ao banheiro, sento no vaso, e vem uma música à minha mente. Me dá vontade de dançar depois de ficar atônita com o que acabara de acontecer. É Papa Winnie entoando os versos de ‘You are my sunshine’. Começo a cantar. Chegou o dia. Que Deus me ajude, eu penso. “You make me happy when skies are gray, you’ll never know, dear, how much I love you…”

Saio do banheiro, ligo para a doula e para a parteira. Agora é só esperar. Vida que segue.

Há exatamente 1 ano meu dia começava assim… ❤

9:30

Em um lapso de falta de confiança, me pego pensando se realmente vou entrar em trabalho de parto, porque, né… meia-hora e nenhuma contração ainda. “Respira, Valentine, não pira! Você sabe que não é assim, certo? CERTO? Isso, inspira, expira.” – começou o diálogo interno que iria me acompanhar até o nascimento.

11:30

Começo a lavar o banheiro, pra tentar controlar minha ansiedade. Coloco música, danço, agacho, levanto, esfrego, esfrego, esfrego. Sou maníaca por limpeza, quero uma casa limpa para ter meu parto domiciliar.

Minha mãe me liga. Ela acha que estou correndo perigo em ficar com a bolsa rompida em casa. Tento tranquilizá-la, mas sabem como é coração de mãe…

Gente, cadê essas contrações? O.o

12:30

Preciso comer algo, mas não consigo. A ansiedade tá demais! Rogério está ansioso e nervoso. Me pergunta se tudo bem ficar todo esse tempo com a bolsa rompida. Se a Carol pode ficar sem líquido. Eu explico direitinho, que a cabeça dela faz uma rolha e que o líquido se renova de hora em hora. Ele foi ao mercado e voltou com uns 3kg de maçãs, 2 mamões, 3 abacaxis. Comprou tudo exagerado… acha que vamos ficar 1 semana em trabalho de parto… rs

Ele me pergunta se tudo bem levar o Caio pra escola e me deixar sozinha. Claro! Até prefiro! Conto para umas amigas que minha bolsa rompeu e que estou esperando. Pena que não posso gritar para o mundo. A parteira me ligou. Vem à tarde pra ver como estou. Mas… não é por nada, não… CADÊ MEU TRABALHO DE PARTO QUE NÃO COMEÇA?

14:00

Vou tomar um banho, decido. Tentei me deitar e descansar. Quem disse que consegui? Todo mundo me sugeriu guardar energias para mais tarde. E esse ‘mais tarde’ é quando, afinal?
Converso com a minha bebê. Pode vir, filha, você é muito bem vinda!

15:30

A Adriana, parteira, veio me avaliar. Batimentos fetais perfeitos, pressão ótima. “Olha, Val, tá com 3 de dilatação! Vai nascer hoje!”

“Como assim, nascer hoje? Mas eu não tô preparada.” – eu falo comigo mesma.

Sentamos na sala, recebo uma ligação do meu pai. Me emociono com ele. É bom saber que tem gente torcendo por mim, mesmo sem concordar com a minha decisão de ter minha filha em casa.

Eu conto da nossa vida na Irlanda, como eu e Rogério nos conhecemos, da nossa história louca de amor. E as contrações que não existiam, chegam tímidas, espaçadas. Ali, conversando e rindo com meu marido e minha parteira querida.

‘Now we’re talking!’ – eu penso.

16:00

Puxa, 7 horas depois, tenho contrações um pouco doloridas. Tenho que parar de falar quando elas vem. Mas eu quero sair de casa. Quero ir passear, quero dar um jeito na ansiedade que tá me consumindo. A parteira, que é de outra cidade, diz que vai ficar por aqui mesmo. Eu digo que não precisa, que vai demorar! ‘Ihhh, vai demorar, pode ir pra casa tranquila. Eu vou sair agora.”. Vou com a condição de que, se ficarem regulares de 5 em 5 minutos, volto pra casa imediatamente.
Fomos à Havan. Coloquei um vestido, um mega absorvente, pois a cada mexida, saía mais e mais líquido. Vazei o dia todo. rs
Eu, que não tinha comido o dia todo, quis comer uma empadinha de palmito. Quando vinham as contrações, eu só parava, respirava e segurava a minha barriga. As pessoas se assustavam e meu marido se divertia, falando “ela está em trabalho de parto”.
‘Puxa, será que estou mesmo preparada?’ – duvido de mim.

17:00

Na saída da loja, uma contração looooonga. Preciso me segurar no corrimão da rampa. Quanto mais eu andava naquela rampa, mais tinha contrações. Uma mulher passou por nós, olhou curiosa e assustada. Meu marido só riu.
Ele buzinava pelas ruas, estava feliz. Vamos buscar meu filho na escola. No carro, as contrações ainda estão sem ritmo algum, mas longas e doloridas. Comparo com o trabalho de parto do Caio. A dor é diferente, mais suave. Suportável. Depois eu dou risada. Meu marido pára o carro no sinal. Olha pra mim, segura a minha mão e me dá um beijo. Fala baixinho “você vai conseguir”. Então vai embora toda a dúvida que eu tinha. Eu vou sim. Podem vir contrações, venham todas, mas venham mesmo! Aqui tem café no bule. – eu lembro de ter pensando isso. rs
E lembro de um tempo bom da minha vida que eu brincava com essa expressão. Sorrio. Olho pra fora, no carro toca “With arms wide open, under the sunlight, welcome to this place, I’ll show you everything..”. Uma lágrima escorre no meu rosto. Venha, filha. Quero saber se você é pretinha ou loira.

18:00

Eu quis muito ir a uma confeitaria comprar mimos para a equipe que cuidaria de mim. Fomos à Maryara. Saindo do carro, uma contração. Quase desisto. ‘Que que eu fico inventando de ficar passeando em trabalho de parto?’. Começava a ficar brava comigo. Não era mais tão bacana.

– Oi! São R$25,00!
– No cartão. – eu digo.
– Pode colocar a senha.
Vem uma contração. Páro. Meu marido sorri. Ele está se divertindo horrores com a reação das pessoas. Erro a senha. Novamente. Acerto.
– Pra quando é seu bebê? – ela quis ser gentil, apesar de estar meio assustada.
– Pra hoje. Estou em trabalho de parto.

E ela se enrolou toda pra empacotar tudo. Queria que eu saísse dali o mais rápido possível. Emendou um ‘boa sorte’.
No carro, eu sabia que um momento muito doloroso se aproximava. A próxima parada era a casa da minha sogra, onde deixaria o Caio. A decisão de não deixá-lo participar foi dura, mas sensata. Eu não tinha certeza da maturidade dele em entender. E não sabia como seria passar por um parto natural. E se eu gritasse e ele ficasse assustado? E se, e se, e se?

18:30

Minha sogra me olha com pavor. Ela tem medo quando falam em parto normal perto dela. Imagina parto em casa! Está muito preocupada. Eu não. Eu estou serena. Aquela ansiedade foi embora. E as contrações rolando. Eu tento disfarçar, para não deixá-la pior ainda. Foi rápido. Peguei umas panelas grandes emprestadas.

Abracei meu menino como nunca.

– Depois a mamãe vem te buscar. Agora eu vou ter sua irmãzinha, tá bom? Amanhã você já pode dar beijinhos nela.
Ele deu uma risadinha, sem entender. Depois disse:
– Igual aquele bebê da água? – que ele viu num vídeo.
– Igualzinho!
– Ela sabe nadar?
– Sabe sim! Fica tranquilo!
– Tá bom, mãe! Vem me buscar daqui a pouco.

E foi-se correndo pra dentro de casa. Era o certo a fazer, eu tentava me convencer.

19:00

Chegamos em casa. É difícil subir os 4 lances de escada até o segundo andar. Quase desisto e tento um parto automotivo (no carro). rs

Cada degrau uma contração. E meu marido me doulando: ‘Vamos lá, só mais um. Vai dar certo. Já está chegando.’. ‘Quer uma cesárea?’ e ri. Eu rio. Uma gargalhada sonora que ecoa no bloco todo.

– Vá dormir, Rogério. – eu peço. Ele está há mais de 24 horas acordado (trabalha à noite). Eu precisarei dele mais tarde. Esse ‘mais tarde’ que a gente nunca sabe quando.

Vou tomar banho. Passo meus cosméticos favoritos. Fico muito tempo no chuveiro. Aliso a barriga e conto pra Carol como é bom aqui fora, quantas pessoas queridas a esperam. O quanto nós a amamos, que é seguro e sempre vou cuidar dela.

Coloquei minhas músicas favoritas pra tocar. Começa uma agitadinha que foi parar no meio das calminhas que eu escolhi como playlist. ‘Ué, como essa música foi parar aí?’. É ‘Save The Last Dance For Me’, do Michael Bublé.
Danço salsa(?) no chuveiro. No meu banheiro minúsculo. Divirto-me muito. Exceto quando vem uma contração. Aí não fica mais divertido. rs

19:30

Saio do chuveiro. Seco meu cabelo pra ficar impecável nas fotos (HAHAHA!), passo maquiagem.
Não comi nada ainda, nem tenho vontade. Casa arrumada, limpa, do jeito que eu gosto.

Decido conversar com a síndica. A chamo pelo interfone e nos encontramos no corredor.

– Olha, vou ter um parto em casa. Estou em trabalho de… sou interrompida por uma contração.
– Como eu dizia… estou em trabalho de parto. Já havia conversado com o síndico anterior e não há nenhum impedimento. Mas talvez você tenha algumas reclamações com barulho, então queria te avisar. Só vai durar umas horas.
– Sem problemas – ela diz. Vou avisar o porteiro, pode deixar. Boa sorte, vou ficar torcendo por você.
– Obrigada. 🙂

19:35

Entro em casa. Ligo para a minha doula. Estou ótima, não precisa vir ainda. Quero ficar sozinha. Entro no facebook. Que vontade de postar “ESTOU EM TRABALHO DE PARTO, GALERAAA!”. Contenho-me. Sento no sofá. Escuto minha playlist. Me dá vontade de ouvir Madonna. Coloco ‘Like a Prayer’. Aproveito pra dançar como se ninguém estivesse olhando. E ninguém está mesmo! “It’s like a dream, no end and no beginning ,You’re here with me, it’s like a dream..”
Opa, que contração diferente. Começo a contar no iPad.

10487324_10204288394632911_2569583036751332686_n20:00

Começo a contar no aplicativo. Sou metódica. Quero contar o início e o fim exatamente, milimetricamente, cronometradamente. rs
Curtas. Fuém. 35 segundos e essa dor? Putz, será que vou aguentar?

Converso com umas amigas no facebook. Uma delas me MANDA desligar essa joça aqui e me concentrar em mim. Levo a sério. Quase a sério. rs

Ainda consigo colocar a senha e desbloquear o iPad para contar cada contração.
Mas de um minuto para o outro, já esqueço a senha, erro, não consigo desbloquear. Chegou a hora. Vou só sentir. Só sentir. Só sentir.

Chegou a hora, vou mergulhar! – eu penso. Não vai ser fácil, eu imagino. Logo eu, cheia de travas emocionais. Li tanto sobre isso na gravidez. É o meu medo, uma distócia emocional. O que? MEDO? EU COM MEDO? JAMÉ! Nem vem de garfo que hoje é dia de sopa… e sigo me lembrando de músicas esquisitas. rs

20:30

Puxa, tá apertando. Começo a me sentir vulnerável. Acho que vou ligar e pedir pra minha doula vir. Será que é muito cedo? Estou sentada na varanda, sentindo a brisa. Quando a contração chega, eu rebolo instintivamente. Passa um morador bem nessa hora, ele olha pra cima. Lá estou eu barriguda, rebolando. É, acho que vou chamá-la sim. Não, vou esperar mais um pouco. Tá fácil, eu aguento.

21:20

Sinto vontade de chorar. Choro. Primeiro danço salsa, depois choro. O que está acontecendo comigo? Meu Deus do céu! Eu choro de alegria e de tristeza. Quero minha mãe comigo. Queria muito ter apoio. Me sinto sozinha. Logo eu que queria tanto ficar sozinha. Não, agora eu não quero mais. As contrações apertam. Olho para o iPad, me dá vontade de tacar na parede. Choro. Conseguimos. Nós conseguimos! Toda a nossa luta e VOU parir em casa. Não vou pedir analgesia nem que chova canivete. Lembro da expressão em inglês para ‘chovendo canivetes’. Raining cats and dogs. Dou risada. Ai, estou bipolar no meu trabalho de parto. Pego o telefone.

– Oi, Silvia, você pode vir? Preciso de você!
– Tô indo. E levando o brigadeiro!
– Por favor!!! Tô te esperando!

Nossa, não comi nada desde a empadinha.

21:40

V-206Estou na cozinha. Olho o calendário. 40 semanas no dia 10/04. “Ah, caprichosinha! Vai nascer UM dia antes da sua data provável?” – converso com ela. Faço carinho na minha barriga. Ah, menina pontual! ❤

22:00

Minha doula chega. Recebo aquele abraço e um cheiro bom de óleos essenciais invade a minha casa. Enfim, posso me entregar. Enfim, me sinto segura o suficiente pra mergulhar fundo.

– Comeu alguma coisa? – ela me pergunta
– Não… não consigo.
– Fala uma coisa que vem à sua cabeça que você gosta bastante.
– Lá na minha geladeira tem caqui. Corta pra mim?

Entre uma contração e outra, ela me dá um pedaço. Não consigo comer sozinha. Eu sinto a contração vindo.

– Tá vindo, Silvia. Tá vindo. Tá vindo. Ai, meu Deeeeeeus, tá vindoooo!

Sinto medo. Com a boca cheia de caqui, quase engasgo na tentativa de respirar só pela boca. Ela segura meu quadril e a dor vai indo embora.

– Ei, o que você fez aí? Tem um botão que desliga a dor, é?

Ela ri. Doulas são mágicas. “Um dia eu vou ser doula”- penso.

22:40

Não consigo ficar deitada para descansar. Estou cansada. ‘Aí, tá vendo, Valentine? Poderia ter dormido à tarde. Não quis! Bem feito!’. Perfeito. Tenho um alterego e ele aparece bem no trabalho de parto.

– Silvia, vou para o chuveiro.
– Vai sim!

A água quente alivia. A contração vem, eu seguro na janela e agacho. Não consigo ficar quieta, tenho que …. aaaaaaaaaaaahhhhhhhhh! Fico ensurdecida, escuto o barulho que tenho aqui dentro apenas. E é muito barulho. Elas vem longas, uma atrás da outra. Quase sem trégua. Minhas pernas doem. ‘Pede analgesia’, meu alterego idiota diz. Não peço!

23:00

Silvia,  que horas a gente liga pra Kelly (Kelly Stein, fotógrafa)?
– Vou ligar. Peraí.

Ouço ela ligando pra Adriana. ‘Tá na fase ativa.’, é a impressão que tenho. Não sei, estou vivendo num universo paralelo. Dentro de uma bolha me parece. Tudo está distorcido: luz, cheiro, som, sentimentos.

Saio do chuveiro. Quem me secou? Estou seca, acho. Sento no vaso. Ai, que alívio. Contração. Aaaaaaahhhhhh! Alívio porra nenhuma. Começo a xingar. Xingo meu vizinho. Xingo? Não sei. ‘ Menos uma, Vale, menos uma.’, me diz a voz suave do meu lado. Obrigada.

23:20???

Vou para o chuveiro. ‘Quer saber? Eu vou agachar aqui. Ficar em 4 apoios’.

– Silvia , pega uma toalha pra mim, por fav… Aaaaahhhhh!
– Pego.

Coloco no chão. Agacho. ‘Puta que pariiiiuuuuuu! Que dor! Assim dói maaaaaaiiissss!’, eu penso. ‘Wonderful, Valentine, agora você não consegue sair dessa posição. Vai ficar inventando moda, vai!’.

‘Cadê a Adriana?’, pergunto pra mim mesma. No meu tempo-espaço distorcido, ela estava demorando. ‘Ai, meu Deus, vou parir desassistido’. Sinto medo. ‘Que nada, ela vai chegar.’. Mais uma contração me tira do meu auto diálogo e me leva pro topo de um vulcão cheio de lava.

23:40???

Saio do chuveiro. Num passe de mágica de doula estou seca.

– Vamos chamar o Rogério? Quer que eu chame?
– Eu chamo, pode deixar. – eu digo. Me arrependo logo em seguida. Preciso andar até ele e não consigo. Um passo, uma contração, um passo, uma contração.

– Rogério, levanta. – eu digo meio violenta batendo na perna dele.

Sinto raiva. Como assim ele dormindo e eu aqui me fudendo? Estou muito brava.

9 de abril de 2014.

00:00

Apoiada no meu marido e na doula, quero ir até a janela do meu quarto tomar um ar. Que é isso nas minhas pernas? É sangue? E no chão? É SANGUE!

– É sangue – diz minha doula. Não se preocupe, é assim mesmo… tá tudo bem. Vou limpar.

‘Ai, sujou meu chão.’ – eu penso. ‘Que mané sujar chão, Valentine! Cê tá doida? Tá parindo e pensando no chão?’- meu alterego está insuportável.

00:05

Quero dormir, estou cansada. Não consigo deitar, não encontro posição.

– Vale, vem cá, vou arrumar uns travesseiros pra você. Fica em quatro apoios na cama e tenta dormir. – diz a minha doula.

Aiiiii, que calooooor! ‘Prende meu cabelo, por favor? Prendeeeee!’. Contração, fogo, lava, vulcão. ‘Passou, prende logo, prendeeee! Tá me irritando esse cabelo idiota. Quando eu parir, a primeira coisa que vou fazer é cortar esse cabelo. Ah, vou! Que raiva, meu!’

Contração. Doooooorrrrrrrrr! Massagem. Quero chorar, não consigo. ‘É a distócia emocional. Eu sabia que ela viria! Não consigo chorar! Que choro falso! Nenhuma lágrima, nenhuminha!’

– Chora, amada, pode chorar, faz bem. – diz minha doula.

Não consigo, me irrito. Barganho. Quero acabar com tudo. Cesá… não! Quem pensou em cesárea aqui? Chega de cama, quero voltar pro chuveiro.

00:15

– Oi, Val! Cheguei!- ouço a Adriana dizer.

Me sinto aliviada.

– Vira pra cá, deixa eu ouvir os batimentos.
– Aaaaahhhhhhh!
– Não tô conseguindo. Você precisa deitar lá na cama.

Deitada na cama dói MUITO mais, mas é rápido, eu aguento. Bebê está ótima. A notícia me deixa feliz.

Ai, quero sentar no vaso. Borrão. Tudo borrado. Sons, imagens e cheiros. Está escuro e silencioso. Meu marido segura a minha mão, a Silvia a outra.

– Aonde eu tava com a cabeça quando queria ter mais filhos?

00:30

– Ai, que vontaaaaaade de fazer cocô!

Percebo os olhares. Percebo a movimentação no quarto do Caio. ‘Está próximo’- eu penso.

V-0901:00

– Venha aqui pra banqueta, Val! – diz a Adriana.

Eu vou. Não penso mais. Não consigo mais pensar em nada. Eu sou aquela dor. Nos consumimos uma à outra. Nos intervalos, estou anestesiada. O colo do meu marido me sustenta. É onde eu descanso. Chego a ter vontade de dormir. Mas lá vem outra e outra e outra contração, num looping infinito.

1:10

Dor. Eu chamo: VEM, FILHA! VEM!

V-093

1:20

Que força meu corpo faz! Sinto a Carol se mexendo, girando. Nossa, já senti isso antes! Que sensação ÚNICA.

– Adriana, tô no expulsivo? – eu pergunto, tentando racionalizar.
– Não sei! Deixa eu ver! Olha! Uma cabecinha aqui… põe a mão!
– Não! – eu digo. Tenho medo, penso.
– Põe sim!

Então, eu coloco a mão e sinto o toque mais macio que já senti na vida. Venha filha, venha! – eu imploro.

1:24

‘Cadê meu marido? Chama ele! Chama! Chama! Vai nascer!’- não tenho forças pra falar, só penso.

1: 26

Meu corpo explode. Não seguro. Vem ao mundo, numa única contração, Ana Carolina Kasin dos Santos.

V-107V-108V-111Bem vinda, minha menina! ❤

V-124

Assim, cercada de amor e respeito, nasceu a Carol. APGAR 10/10. Períneo íntegro. Nenhuma intervenção. Rodeada das pessoas que eu escolhi. Foi para o meu colo, de onde nunca mais saiu. Foi amamentada na primeira hora (mamou 2 horas!!!).

Na manhã do dia 9, Caio encontrou sua irmãzinha pela primeira vez. Nós filmamos a reação dele… ❤

.

.

.

Carol, feliz 1 aninho, meu amor! Que a sua presença nesse mundo faça tanta diferença quanto faz na minha vida. Tua chegada me virou do avesso, me mostrou que é possível amar dois filhos, e que é sempre possível sorrir todos os dias, independente das circunstâncias.

Eu materno você com todo meu amor e dedicação. Farei sempre tudo que puder para ser a mãe mais presente, mais amorosa, mais companheira.

“You are my sunshine, you make me happy when skies are gray… you’ll never know dear how much I love you…”

11149817_10206277623642393_1320874728727245204_o

.

.

.

Um ano depois eu ainda tenho muitos insights sobre meu parto, que não foi o parto que idealizei (que mulher não idealiza?), mas foi um parto maravilhoso. Minha primeira experiência foi tão artificial (apesar de emocionante porque afinal nascia meu primeiro filho), que eu não queria repetir. Quando optei pelo parto absolutamente natural, eu não fazia ideia de onde me metia. A gente nunca tem noção real do que será. Eu via os vídeos de parto romantizados e editados e me imaginava parindo na água, com harpas angelicais tocando no meu ouvido. Não foi nada disso. Foi um parto de desencontros. Parteira que não chegou a tempo, pai que não viu a filha nascer. Durante muito tempo me apeguei a isso, a esses detalhes, que considerava imperdoáveis. No pântano escuro do puerpério, eu precisava me agarrar a essas coisas, pra tirar o foco de mim, de olhar pra dentro de mim. Eu não estava preparada. Parir uma menina era demais.Era muito para o meu histórico de vida. Remoí. Ruminei. Um ano. Um longo fucking ano. E como tudo na minha vida parece uma grande teia, que interliga tudo, eu me tornei uma profissional que acompanha partos. Com um novo olhar eu pude, enfim, ver. Com quanto respeito e amor fomos tratadas. O nervosismo do momento. O evento incontrolável em todas as nuances. Hoje, um ano depois, eu resolvo amar e perdoar. Perdoar a mim mesma. E pedir perdão. Peço perdão a quem magoei. Me afastei de pessoas que amo, me fechei nesse casulo puerperal. Hoje, no aniversário da minha filha, eu saio. No meu tempo. Eu precisei dele. E agradeço, só agradeço. Hoje, eu libero amor, perdão e gratidão. Feliz saída de casulo pra mim. Foi suficiente.

Um comentário

Deixe um comentário